Mensagem de Páscoa, D. António Augusto

Mensagem de Páscoa, D. António Augusto

Páscoa, passagem para uma vida mais plena

         A celebração anual da Páscoa é momento para todos refletirem no sentido profundo desta festa maior do cristianismo e para reviverem espiritualmente as experiências que lhe estão subjacentes.

No sentido mais antigo, Páscoa significava a passagem do povo hebreu da terra de escravidão para a terra da liberdade, tornada possível com a intervenção de Deus. Agindo dessa forma, Deus mostrou que não era indiferente ao sofrimento do seu povo, continuando a acompanhá-lo durante a dura travessia do deserto até chegar à terra dos seus sonhos.

Viver o genuíno espírito pascal significa acreditar que muitas «passagens» são necessárias e possíveis, que não há barreiras intransponíveis. Nos dias que correm, diante de sinais alarmantes como a acentuação de injustiças, a corrida aos armamentos, a polarização das sociedades, a proliferação de discursos do medo e do ódio, é necessário operar vários tipos de «passagem». Uma passagem que leve ao despertar da letargia em que muitos se encontram para que se disponham a caminhar com quem não se resigna nem desiste de buscar um futuro melhor. A passagem libertadora de regras injustas, hábitos nocivos, linguagens manipuladoras ou formas de pensamento condicionadas. A passagem que implique o abandonar de espaços ou esquemas de violência, corrupção e desumanidade para promover relações e ambientes mais pacíficos, fraternos e solidários.

Na Páscoa de Jesus Cristo realizou-se a passagem mais importante e decisiva, aquela que leva da morte à vida. Após a experiência dramática da paixão e da morte, Jesus foi libertado da prisão do sepulcro e ressuscitou para a vida plena. Esta boa nova pascal concentra-nos na matriz original do cristianismo e desafia-nos a renovar a fé na presença do Ressuscitado e a confiança de que Ele estará sempre connosco até ao  fim dos tempos. Com a força do seu Espírito será possível remover todas as pedras que ainda mantêm muitas pessoas fechadas em autênticos sepulcros de solidão, desânimo ou sofrimento.

Para os cristãos, a celebração da Páscoa é o momento especial para tomar consciência do tesouro da fé e afirmá-la de forma alegre e corajosa. Na Páscoa reencontramos ainda a identidade originária da Igreja como comunidade de batizados, animados pelo Espírito do Ressuscitado e chamados a testemunhá-lo no mundo. Nesta festa, da qual tudo brota, descobrimos a inspiração para a necessária renovação eclesial, a passagem de uma Igreja cansada, rotineira e envelhecida para uma Igreja cheia da vida nova do Espírito e com um rosto  rejuvenescido.

         Para que essa passagem seja efetiva, precisamos de nos deixar conduzir pelo Espírito no modo de enfrentar este momento de crise provocada pela revelação dos casos de abusos sobre menores. Acabou de ser retirada a pedra que mantinha o silêncio sepulcral sobre estes dramas que abalaram a vida de muitas pessoas. O confronto com a realidade foi doloroso mas simultâneamente libertador, foi condição necessária para uma autêntica purificação. Continuemos a fazer juntos este caminho que implicará enfrentar a verdade, assumir responsabilidades, cuidar das pessoas mais feridas e tomar medidas que evitem que estes casos voltem a ocorrer na Igreja, na sociedade ou na família.

         O Espírito do Ressuscitado é a força de que carecemos para um verdadeiro renascimento pessoal que leve cada um a passar do homem velho ao homem novo, passar do cristão desanimado e triste a uma autêntico «discípulo de Emaús». Ele é o artífice que anima e conduz a Igreja para que viva estes tempos como oportunidade de renovação, de forma a dar mais e melhores frutos. O Espírito é ainda a energia espiritual a que o mundo pode recorrer para trilhar caminhos novos que conduzam à paz e à fraternidade entre os povos.

         A Páscoa de Jesus ensina duas lições básicas que sustentam a nossa confiança. A primeira: a morte de Jesus na cruz pareceu o fim de um sonho mas com a sua ressurreição tudo recomeçou. A segunda: no início, o Ressuscitado manifestou-se a um grupo de apenas Onze, mas, a partir de então, a boa nova pascal nunca mais deixou de ecoar, de forma que a Páscoa é celebrada por uma multidão de crentes em todo o mundo.

         A todos os diocesanos de Vila Real, a todos os homens e mulheres de boa vontade, às crianças e aos jovens, a todas as famílias, aos emigrantes e imigrantes, aos mais pobres, aos que estão a passar por maiores dificuldades e sofrimentos, endereço os meus votos de Santa e Feliz Páscoa. Que Deus a todos abençoe e conceda saúde, alegria e paz.

Vila Real, 30 de março de 2023

+António Augusto de Oliveira Azevedo